by 4(Quatro)Rodas
Nelson Piquet e Nigel Mansell tiveram suas passagens na Williams marcadas por atuações espetaculares e também pela guerra nos bastidores. Em 1986, Mansell, o "Leão" para os ingleses, foi vice e Piquet 3º, separados por um pontinho, 70 a 69. Portanto, era lógico que eles entrassem em 1987 certos de que o maior inimigo estava dentro da própria trincheira, afinal, ambos pilotavam o Williams FW 11B, uma obras prima da F-1, dotado de inovadora suspensão ativa.
Novamente o campeonato abriu no Brasil, no Rio de Janeiro, já com a dupla da Williams dominando o grid: Mansell na pole position de Piquet ao seu lado. Alain Prost, com o McLaren-Tag ganhou a corrida, Piquet fechou em 2º e Mansell foi 6º.
Logo Piquet e Mansell sentiram que, além da disputa pessoal, tinham que se precaver com os adversários. Além de Alain Prost, que havia lhes roubado o título em 1986 e contava com o McLaren-Tag, Ayrton Senna pilotava um Lotus com motor Honda turbo, igual aos propulsores da Williams.
Na primeira prova da fase européia, no GP de San Marino, disputado em Ímola, Piquet chegou ansioso para competir com a nova suspensão ativa do FW11, que ele tinha desenvolvido durante os últimos meses. Entrou na pista para os treinos de sexta-feira e foi logo pulverizando os tempos. Ele já tinha cravado a melhor volta em 1'25"897 e dava pinta que poderia melhorar ainda mais, porém o seu pneu traseiro direito estourou e o Williams voou a 290 km/h contra o muro, destroçando-se totalmente na extinta curva Tamburello - a mesma da tragédia de Senna em 1994. Foi um impacto terrível no qual o piloto, além de um forte contusões nos ombros, tórax e joelho direito, sofreu traumatismo craniano,
Piquet foi submetido a rigorosos exames e, embora não tenha acusado nenhuma anormalidade, acabou sendo proibido de participar do Grande Prêmio, embora aquele tempo lhe garantisse o segundo lugar no grid.
Hoje, Piquet admite que nunca voltou a ser o mesmo depois daquele acidente. Por longo tempo não conseguiu dormir mais de duas horas seguidas, tinha pesadelos, ansiedade, e dificuldade de concentração. Porém, a pior seqüela foi a perda do sentido de aproximação, fundamental nas pistas no momento de fazer uma ultrapassagem.
Nas sete primeiras corrida, Piquet não teve o gosto da vitória. Nigel Mansell venceu em San Marino, França e Inglaterra, Prost no Brasil e na Bélgica, enquanto Ayrton Senna havia levado a melhor em Mônaco e Detroit. Ao final da 7ª etapa, o líder era Ayrton Senna com 31 pontos. Um ponto atrás estavam Mansell e Piquet ( com cinco 2º lugares) e Prost tinha 26. Piquet só desencabulou na Alemanha, passando a líder pela primeira vez, com 39 pontos, 4 à frente de Senna e 9 do Leão.
Tudo isso tornava o campeonato lindo, mas dentro da Williams o ambiente fervia, com Piquet sentindo que havia preferência por Mansell.
"Você quer saber sobre fofocas da Williams? Eu conto" - ele me dissesem rodeios, quando passamos a limpo a temporada de 1987. "Teve muita sacanagem. O Patrick Head, projetista e chefe da equipe, foi contra minha ida para a Williams. Ele queria provar que poderia ser campeão com seu carro e um piloto que ainda não tivesse um título. Bobagem dele, provar o que todo mundo já sabia: que o FW11 era o melhor da F-1".
O maior atrito entre os dois pilotos da Williams era a suspensão ativa. Piquet tinha desenvolvido aquele sistema e achava que com ele o carro ficava mais confortável e competitivo. Um carro para ser - como de fato foi - campeão. Já Mansell preferia a suspensão convencional, menos exigente no acerto. Foi com essa controvérsia que eles foram para o GP da Alemanha.
Enquanto Mansell se preocupava em voar na veloz Hockenheim, Piquet acertava a suspensão ativa para a corrida. Resultado: o Leão fez a pole position, e a volta mais rápida da corrida, mas a vitória foi brasileira, com Piquet fechando as 44 voltas da prova 1 minuto e meio à frente do McLaren de Stefan Johansson e uma volta de Senna. Mansell rodou na 25ª volta.
Piquet, então, resolveu trabalhar para ele e não mais para o time. Treinava com o carro titular e preparava o reserva para a corrida, como fez na Hungria, onde mudou todo o acerto do carro depois do warm-up.
"Eu não abria o jogo para os mecânicos antes, não passarem os seus acertos para o carro do Mansell. Um pouco de malandragem fazia eles baixarem a bola", gabou-se Piquet após a vitória.
No GP da Áustria, Piquet e Mansell largavam na primeira fila pela 8ª vez naquele campeonato, provando que o FW 11B era estupendo, tanto que iria fechar o ano como carro campeão, com 137 pontos contra 76 da McLaren MP4-3, segundo colocado. O Leão venceu, mas Piquet deu o troco na Itália, marcando a sua irreverência ao responder o repórter da RAI (tv italiana) que insistia em saber a sua tática de corrida. Ao vivo, minutos antes da largada, ele revelou seus planos: "Quero que o Senna e o Mansell dêem uma porrada na primeira curva e o motor do Prost se exploda na seguinte: tudo isso está nos meus planos, para vencer mais facilmente".
No GP de Portugal Piquet foi 3º e Mansell não concluiu a prova, mas na Espanha voltou a dar Leão.
Na reta final do campeonato o bastidor da Williams fervia. O diretor técnico Patrick Head, atendendo os apelos de Mansell, resolveu que nas três corridas finais, México, Japão e Austrália, eles não competiriam com a suspensão ativa. Piquet sentiu o golpe. Irritado, fechou a cara e não dava nenhuma informação sobre seu trabalho com o carro.
"Quiseram me ferrar e eu dei o troco. Não sou de ficar acertando carro para nenhum babaca", reclamou.
Mas a sorte escolheu Mansell no México. Piquet liderou boa parte da corrida, mas houve um acidente na 32ª das 63 voltas e a corrida teve uma segunda largada, na qual o seu carro patinou uma poça de óleo e perdeu a ponta para Mansell, que venceu. Piquet fechou em segundo, mantendo a liderança com 73 pontos, contra 61 do Leão.
Eles foram, então, para o Japão em clima de grande decisão - com a vantagem que tinha, Piquet poderia deixar Suzuka como campeão. Mas o esperado duelo de feras na pista infelizmente não aconteceu.
Mansell, obcecado em conseguir a pole position, errou a tomada da curva Spoon, bateu no guard-rail e ficou inerte dentro do carro. Foi retirado do cockpit e levado, ao hospital e desistiu de competir.
No entanto, 20 anos depois, Piquet garante que Mansell poderia correr, mas preferiu fazer drama, pois sabia que seria muito difícil vencê-lo na briga pelo título e quis se passar por vítima.
"Essa informação - me contou a Piquet - foi do médico da FIA, o doutor Sid Watkins, que atendeu o Mansell e deu sua autorização para ele competir normalmente".
Piquet largou em 5º, esteve em segundo, mas na 46ª das 51 voltas da corrida, o motor quebrou. Desapontou-se, mas com 73 pontos, 12 à frente de Mansell, era tricampeão antecipado, independente da corrida final na Austrália. Só lamentou sair de Suzuka sem dar a vitória Honda, uma homenagem que fazia questão de prestar pelo ótimo desempenho dos motores nipônicos.
Naquele dia, Piquet me contou outra de suas das histórias, bem própria da personalidade marota e, muitas vezes, azeda. Ele se divertia até mesmo com os chefões, como fez no final de 1985 com Bernie Ecclestone e Ron Dennis. Os dois cartolas apostaram 10 000 dólares: Ecclestone bancava que manteria Piquet no seu time, a Brabham, enquanto Dennis garantia que contrataria o brasileiro para a McLaren. Piquet deu força à aposta e conseguiu deixar ambos empatados no ridículo, porque o brasileiro já tinha assinado com a Williams.
Para quem acha que a tecnologia está matando o romantismo da F-1, pode concordar que está na hora de levantar uma estátua ao inspirado Piquet. E de corpo inteiro.
Carreira:
Nelson Piquet Souto Maior participou de 204 GPs, de 1978 a 1991. Fez 24 poles position, venceu 23 corridas, marcou 465,5 pontos e emplacou um tricampeonato (1981, 1983 e 1987). Liderou 1571 quilômetros e marcou 23 recorde de voltas. Foi o primeiro campeão da era turbo, com o Brabham-BMW, em 1983, e o pioneiro em vitórias com a suspensão ativa da Williams.
1987 - 16 GPs
Campeão: Nelson Piquet, 73 pontos;
2o Nigel Mansell 61
3o Ayrton Senna, 57
4o Alain Prost, 46
5o Gerhard Berger, 36
6o Stefan Johansson, 30
7o Michele Alboreto, 17
8o Thierry Boutsen, 16
9o Téo Fabi, 12
10o Eddie Cheever, 8
11o JonathanPalmer e Satoru Nakajima, 7
13o Riccardo Patrese, 6
14o Andrea de Cesaris e Phillipe Streiff, 4
16o Derek Warwick e Phillipe Alliot, 3
18o Martin Brundle, 2
19o Ivan Capelli, René Arnoux e Roberto Moreno, 1
Construtores:
Campeão: Williams, 137
2o McLaren, 76
3o Lotus, 64
4o Ferrari, 53
5o Benetton, 28
6o Tyrrell e Arrows, 11
8o Brabham, 10
9o Lola, 3
10o Zakspeed, 2
11o March, Ligier e AGS, 1
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